sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Pessoa

Deixo ao cego e ao surdo
A alma com fronteiras,
Que eu quero sentir tudo
De todas as maneiras.

Do alto de ter consciência
Contemplo a terra e o céu,
Olho-os com inocência. . .
Nada que vejo é meu.

Mas vejo tão atento
Tão neles me disperso
Que cada pensamento
Me torna já diverso.

E como são estilhaços
Do ser, as coisas dispersas
Quebro a alma em pedaços
E em pessoas diversas.

E se a própria alma vejo
Com outro olhar,
Pergunto se há ensejo
De por isto a julgar.

Ah, tanto como a terra
E o mar e o vasto céu.
Quem se crê próprio erra,
Sou vário e não sou meu.

Se as coisas são estilhaços
Do saber do universo,
Seja eu os meus pedaços,
Impreciso e diverso.

Se quanto sinto é alheio
E de mim se sente,
Como é que a alma veio
A acabar-se em ente?



Assim eu me acomodo
Com o que Deus criou,
Deixo teu diverso modo
Diversos modos sou.

Assim a Deus imito,
Que quando fez o que é
Tirou-lhe o infinito
E a unidade até.


(Fernando Pessoa)

ESTREIA




Em Pessoa no Theatro Circo



marcações > 253 217 167 | ctb@ctb.pt
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quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

ESTREIA > 21 de Janeiro de 2014


Uma imensa humanidade é o que perpassa nas palavras de Fernando Pessoa, poeta e pensador maior da nossa literatura. Impregnadas de memória e sonho, de quotidianos cheios, afinal, de gestos inúteis, mas sobreviventes ao tempo eterno do mundo; palavras vitais de um espanto iniciático que desnuda o absurdo da vida-morte sob a camada implacável da pulsão artística.
Este espectáculo tem como foco o processo/drama da criação artística como terreno de busca de uma identidade; letras, vozes, corpos múltiplos, distintos nas formas de Caeiro, Campos e Reis, procuram afirmar a sua originalidade e a sua diferença mas, sabemos, todo o seu sentido se reúne no universo complexo e inominável de um só Pessoa, estilhaçado.
Em corpo-presente, no palco, será possível resgatar essas centelhas fulgurantes de lucidez e criação, alimento intemporal? Esperamos que sim.
Sílvia Brito

textos de Fernando Pessoa | dramaturgia e encenação Sílvia Brito | elenco André Laires, António Jorge, Thamara Thaís | voz off 'The Poem' Solange Sá | espaço cénico António Jorge | criação vídeo Frederico Bustorff Madeira* | desenho de som Pedro Pinto* | desenho de luz Nilton Teixeira | fotografia e design gráfico Paulo Nogueira
M/12 | 75'

* do Centro de Criação de Vídeo e de Som RODAVIVA